A nova legislatura: as incidências e os sinais

Foram poucos os atos politico-legislativos que ocorreram desde a vitória da AD mas já nos merecem algumas análises. Desde a eleição do Presidente da Assembleia da República, que se achava ser uma confirmação meramente formal, até ao primeiro ato desde novo Governo. O CHEGA mostrou ao que vem. Condicionar toda a política em redor do tabuleiro dos apoios e coligações. Se por um lado apelida o PSD de "prostituta política", por outro quer acordos com Luís Montenegro. Ao mesmo tempo que repudia o PS e que diz que o PSD é igual ao partido socialista, quer negociar com os sociais democratas. André Ventura afirmou ter um acordo, tendo sido o mesmo desmentido por várias pessoas ligadas à AD, nomeadamente pelo o atual ministro dos negócios estrangeiros e ministro da defesa. Acordo esse que incidia numa reciprocidade na nomeação do nome indicado pelo PSD e do indicado pelo CHEGA para Vice-presidente da AR. Parece-nos claro que não houve uma negociação mas sim o cumprimento de uma formalidade. O PSD convenceu-se que André Ventura cumpriria a palavra e votava em Aguiar Branco, deixando um vazio na negociação da escolha do nome com outros partidos. Um erro. Uma demonstração de uma arrogância e de um certo amadorismo. O que se podia esperar dum partido que tem o mesmo número de deputados do PS? Arrogância? Começou mal. E foi exatamente o partido perdedor, que tem um número de deputados igual ao partido vencedor, que deu solução para o Parlamento começar a funcionar, ao dividir a presidência da AR entre PSD e PS. O mais caricato foi posteriormente Pacheco de Amorim ter sido eleito pelo PSD e pelo CHEGA para ser um dos vice-presidentes da AR. De lembrar que Pacheco de Amorim pertenceu ao MDLP, um grupo terrorista que se formou no pós 25 de Abril e foi responsável pela morte de algumas pessoas. A situação é bastante estranha mas o que é certo é que o PSD cumpriu com o que prometera e deu luz verde à sua eleição. É evidente que André Ventura aproveitou o momento para dizer que o PSD e PS se juntaram, fazendo uma alusão aos "tachos". Narrativa que caiu, após a eleição de Pacheco de Amorim, de Pedro Frazão e de outros que ocupam, agora, lugares de algum prestígio político. Ultrapassada a eleição dos membros que compõem a mesa da AR, tivemos a tomada de posse. Não faremos análise aos ministros que foram eleitos por entender que deve haver espaço para mostrarem as suas habilidades e esse escrutínio não será, para já feito. No discurso do novo Primeiro-ministro, foram ditas expressões que nos lembram dos tempos de Cavaco Silva, como "deixem-nos trabalhar" ou "forças de bloqueio". Nada contra a utilização dessas palavras. Pareceu um pouco excessivo mas isso não foi o pior. Ouvimos um discurso politizado ao invés de um discurso mais focado nas pessoas. Um governo que tem como discurso inicial a representação de um combate político que quer travar com o PS. Errado mais uma vez. Este primeiro discurso deveria ser virado para as forças de segurança, para os profissionais de saúde, para os professores, para as classes mais desfavorecidas e para os pensionistas. Mas não. O discurso adotado foi para dizer ao país que o PSD quer governar com o seu programa e que o PS tem de o viabilizar. O que é uma autêntica vergonha. Adotar-se uma narrativa como se tivesse ganho as eleições por bastante (já nem dizemos por maioria absoluta). Falar-se na corrupção quando somos um país que tem milhares de leis que combatem esse crime, sendo Portugal um dos países mais desenvolvidos nessa matéria, acima da média europeia, é populismo. O que precisamos é de fazer executar as nossas leis e desburocratizar alguns processos. Pegar nos temas que a extrema direita tem como bandeira, não é esvaziar a ação do CHEGA, é reforçar ainda mais a sua importância. Não dizemos que não se devem debater temas que são abordados pelo CHEGA. Não se deve governar é em função da sua agenda política. E é isso que Luís Montenegro começou por fazer. Primeiro, já fala com os partidos todos novamente. Quer receber propostas dos mesmos para o combate à corrupção. Parte logo de uma ideia errada. O PSD, partido que governa Portugal, é que deve ter a iniciativa de mostrar ao que vem. Ou está à espera de governar com as ideias que vêm dos outros partidos? Parece que é apenas uma questão semântica, mas não é. Aquilo que o PSD deve fazer é apresentar as suas propostas aos partidos e esperar deles outras que venham completar as suas. Não é dizer aos partidos "mandem-nos propostas" e depois juntar algumas e fazer dessas sugestões a "sua proposta". Não nos parece que os partidos vão jogar esse jogo. E, já agora, não deviam. Quanto à primeira medida do Governo de Luís Montenegro em substituir um logotipo usado nas plataformas digitais, só mostra uma falta de noção enorme. Não mudamos o símbolo nacional, nem mudamos a bandeira, nem tiramos o brasão dela. Mas que estupidez! Simplesmente adotamos um logotipo que é funcional, feito por um dos melhores designers portugueses. E espante-se, a concorrer pela vitória internacional do logotipo que ora foi substituído. Como sabemos que a conversa sobre o logotipo não vai ficar por aqui, pois temos de aguardar pelos custos desta mudança, dado a que o logotipo agora utilizado não é funcional nas plataformas, voltaremos ao assunto. O que se retira disto é a simbologia da primeira medida deste Governo, ser para corresponder a uma agenda de cancelamento e de querer se aproximar dos eleitores mais radicais e nacionalistas do CHEGA. Embora não tenha uma influência direta na vida das pessoas, é dado um sinal político claro. O de querer esvaziar o CHEGA, correspondendo às suas ideias, sem que com isso o esvazie. Ao invés, poderá dar mais força e mostrar que um voto no CHEGA é de facto um voto com utilidade. Numa narrativa de "vês? Se o CHEGA não tivesse tantos votos isto não se mudava nem se fazia", logo "temos de continuar a votar neles". É preciso calma, cautela, rigor e, essencialmente, boas políticas públicas. O resto, é resto.